Futuro próximo: Artemis

Atualização (15 de agosto de 2022): depois das duas rodadas de testes molhados, em abril e junho de 2022, o SLS e a Orion voltaram para o Vehicle Assembly Building, foram preparados, e vão sair amanhã (16 de agosto de 2022) para a plataforma, para o lançamento em 29 de agosto. O movimento do foguete para a plataforma começa dia 16, às 20h de Brasília, e a transmissão ao vivo começa às 16h de Brasília no canal do Kennedy Space Center no Youtube: https://www.youtube.com/kscnewsroom

https://blogs.nasa.gov/artemis/2022/08/15/artemis-i-moon-rocket-ready-to-roll-to-the-launch-pad

Está próximo o retorno humano para a Lua! Hoje (17 de março de 2022), o primeiro foguete SLS carregando uma cápsula Orion será levado (rolled out) do local onde foi montado (o Vehicle Assembly Building, VAB, no Kennedy Space Center da NASA), para o complexo de lançamento 39B (LC-39B). Lá serão realizados os testes com o veículo completo e carregado com propelentes, a partir de 1 de abril. Depois dos testes, ele será levado de volta ao VAB, para remoção dos equipamentos de teste e preparação final para o lançamento da missão Artemis I, por volta de maio de 2022.

Este é o primeiro artigo no que deve ser uma longa série sobre o Programa Artemis. Afinal, serão dezenas de missões ao longo de décadas. Veja também nosso artigo sobre o foguete SLS:

Oficialmente estabelecido como Programa Artemis em 2017, este vai levar as primeiras pessoas à Lua desde a Apollo 17, em 1972. Ao contrário das missões Apollo, que foram viagens curtas com só dois astronautas fazendo visitas rápidas à superfície da Lua, o Artemis é muito mais ambicioso: a proposta tem atualmente 11 missões Artemis, com viagens durando de 10 a 60 dias, incluindo a construção de uma estação espacial em órbita da Lua (Lunar Gateway, a partir da Artemis III) e uma base na superfície da Lua, perto do polo sul, que seria visitada repetidamente por astronautas a partir do Gateway, a partir do Artemis VII. A primeira missão, que deve ser lançada por volta de maio de 2022, será um teste não tripulado de todo o equipamento, o primeiro vôo do foguete SLS e com a cápsula Orion indo até a Lua e voltando. Todas as missões a partir da Artemis II serão tripuladas, com pousos na Lua a partir da Artemis III.

Qual é o objetivo do Programa Artemis?

Esta presença humana prolongada e com repetidas viagens para a Lua permitirá desenvolver e testar tecnologias necessárias para estabelecer uma base permanente na Lua e para viagens mais distantes e mais longas, como para Marte. Isso inclui naves parcialmente ou completamente reutilizáveis para vôos entre a órbita da Lua e a superfície, reabastecimento de naves no espaço, uso de recursos (minerais e água) da superfície da Lua, geração de energia por usinas nucleares, comunicações e cultivo de plantas para consumo. Além disso, testará o sistema de contratar vários elementos das missões Artemis e várias das 24 missões de suporte (não Artemis) por empresas privadas (além das que são colaborações internacionais), que desenvolveriam seus próprios meios para entregar cargas à órbita ou superfície da Lua – tanto missões científicas de suporte como suprimentos à tripulação. Pode-se ver a evolução dos objetivos ao longo das décadas: em 1950-1960 o objetivo era simplesmente chegar ao espaço; em 1960 era chegar à Lua; em 1970-2020 era manter uma presença humana prolongada no espaço, em órbita baixa da Terra, para desenvolver tecnologias e procedimentos para manter humanos vivos e saudáveis no espaço. Agora, o Programa Artemis é o primeiro passo para ir além, estabelecendo presença humana em locais de onde não é possível escapar imediatamente para a Terra em caso de emergência, nem contar com uma missão de resgate vindo rapidamente. Ir para Marte diretamente, uma viagem de anos, seria um salto (portanto, risco e custo) muito grande. A Lua oferece um passo intermediário, para aprender a manter humanos isolados da Terra por períodos cada vez maiores, fora da proteção contra radiação oferecida em órbita baixa pela magnetosfera da Terra. Por isso essa estratégia é chamada “da Lua para Marte” (Moon to Mars).

Por que levou tanto tempo para voltarmos à Lua?

Desde a época da Apollo, houve muitas propostas de outras missões para a Lua, de escopos muito variados. O problema principal sempre foi o mesmo: o custo muito alto. Com todo o Programa Apollo, foram gastos cerca de 200 bilhões de dólares (atualizando pela inflação), ao longo de mais de uma década, com cerca de 400 mil pessoas trabalhando. E as 3 últimas missões do Apollo, cuja preparação já tinha sido inciada, as Apollo 18, 19 e 20, foram canceladas pelo governo (Congresso e presidência americanos, que são quem decide o que a NASA faz), devido ao alto custo e risco, já tendo 6 pousos de sucesso na Lua entre as Apollo 11 e 17 (a 13 teve que voltar sem pousar na Lua, devido a uma explosão no caminho). A década de 1960 teve uma conjunção de muitos fatores políticos, incluindo a Guerra Fria e a Corrida Espacial com a União Soviética, que foi necessária para tornar possível um projeto desta magnitude de custo, inovação e risco.

Depois do Apollo, o foco do programa tripulado americano se tornou órbita baixa da Terra, com a estação espacial Skylab (1973-1979) o Ônibus Espacial, que fez 135 vôos de 1981 a 2011 e a construção da Estação Espacial Internacional, de 1998 a 2011 e a operação da Estação Espacial, que se espera continuar até por volta de 2030. Com o final da operação do Ônibus Espacial e da construção da Estação Espacial, houve espaço para mais foco para novas missões tripuladas indo além da órbita baixa da Terra. Com as melhorias em tecnologia e através do reuso de elementos do Ônibus Espacial, nesta época começou a se tornar viável um novo programa para viagens tripuladas para a Lua e além. Em 2005, foi iniciado o programa Constellation, que previa dois novos grandes foguetes, Ares I e Ares V e a cápsula Orion, para transportar tripulação em viagens à Lua e além. Mas fatores políticos novamente dificultaram estes objetivos e uma análise de 2009 indicando que o programa não tinha financiamento suficiente para atingir seus objetivos levou ao cancelamento do Constellation, com o anúncio em 2010 da construção do foguete SLS no lugar dos Ares I e V e da continuação do desenvolvimento da cápsula Orion, embora ainda estivesse vago quando e para que missões eles seriam usados. Só em 2017, com o maior desenvolvimento do SLS e da Orion, se tornou viável estabelecer um programa mais concreto para viagens à Lua, que foi então como se originou o programa Artemis.

Como é a nave? Orion e SLS

Os astronautas viajarão em cápsulas Orion, que seguem um conceito semelhante às das missões Apollo:

Comparação entre a cápsula e módulo de serviço, dos programas Apollo (esquerda) e Artemis (direita). Créditos: NASA

As Orion são maiores, principalmente em volume habitável interno (9m3, comparado a 6m3 das Apollo), pois computadores e sistemas de controle ocupam muito menos espaço hoje. Juntamente com o Módulo de Serviço Europeu, fornecido pela Agência Espacial Européia (ESA), elas podem suportar até 6 astronautas (Apollo levava 3 e a versão modificada para a estação Skylab podia levar até 5).

Para carregar a Orion até a Lua, será usado o novo foguete de grande porte desenvolvido pela NASA, o Space Launch System (SLS). O SLS será um dos maiores foguetes da história (não vamos discutir onde ele fica em um ranking, pois há diferentes métricas que levam a diferentes resultados e essa diferença não é relevante aqui). Ele foi desenvolvido a partir de 2010, para possibilitar missões da NASA além da órbita baixa da Terra – missões tripuladas para a Lua e Marte e veículos interplanetários grandes não tripulados. Fazendo uso de tecnologia desenvolvida para o programa do Ônibus Espacial, inclusive reusando muitos elementos que já voaram com os Ônibus Espaciais, o SLS lembra bastante a aparência do conjunto do Ônibus Espacial, sem este preso ao lado.

A cápsula Orion e o Módulo de Serviço Europeu sendo acoplados ao topo do foguete SLS, no Vehicle Assembly Building, do Kennedy Space. Apenas a parte superior do foguete é visível. Center. Créditos: NASA

Nesta imagem, que mostra a Orion e o Módulo de Serviço Europeu, não é óbvio que eles estão no topo do foguete SLS, devido às plataformas que cercam o foguete para dar acesso durante a instalação e testes. Agora que as plataformas foram removidas é possível ver o conjunto completo:

Cápsula Orion e o foguete SLS da missão Artemis I, prontos para saírem do Vehicle Assembly Building (VAB) no Kennedy Space Center. Créditos: NASA

Veja mais sobre o SLS em nosso artigo sobre ele:

Lunar Gateway e bases lunares

Uma visão do Lunar Gateway. Créditos: NASA

Mas a maior diferença em capacidade do Artemis, comparado ao Apollo, não está na cápsula ou no que é carregado em um vôo do foguete. Está no uso de múltiplas missões, apenas algumas delas sendo Artemis / SLS, para levar equipamento para permanecer na órbita e na superfície da Lua: A estação espacial Lunar Gateway, em órbita da Lua e os vários módulos a serem deixados na superfície, formando a base lunar. Dessa forma, a cápsula Orion será apenas um pequeno transporte para a tripulação chegar a instalações muito maiores e mais capazes na Lua – assim como as atuais cápsulas usadas para ir à Estação Espacial Internacional (Soyuz, Dragon e Starliner) são apenas pequenos transportes para levar a tripulação à instalação que é seu destino.

Componentes do Lunar Gateway e as agências responsáveis por sua construção. Créditos: NASA

Desta forma, os astronautas chegarão ao Gateway usando a cápsula Orion. O Gateway terá espaço habitável e de trabalho, suprimentos para os astronautas e será a plataforma onde o veículo que levará até a superfície da Lua, o Human Landing System (HLS) irá atracar. Com o HLS, que deve ser ao menos parcialmente reutilizável, os astronautas poderão descer para a base a ser construída na superfície da Lua.

Uma representação da base proposta, com o Foundational Surface Habitat ao fundo e o Mobile Habitat no meio.

Inicialmente, os elementos da base serão um grande módulo habitável fixo, o Foundational Surface Habitat, um grande módulo habitável móvel, o Mobile Habitat e vários equipamentos de suporte, incluindo rovers não tripulados para explorar a região remotamente, um veículo aberto para carregar os astronautas expostos (ao contrário do Mobile Habitat, que será pressurizado), uma usina elétrica nuclear, equipamentos de comunicação e outros experimentos científicos. Assim, ao contrário das missões Apollo, no Artemis não se vai ter que carregar todo o equipamento em cada viagem. Haverá um local em órbita e um local na superfície onde vão ser acumuladas instalações e mais equipamentos, crescendo gradualmente com cada nova missão Artemis e missão de suporte não tripulada entregando cargas. Assim como a Estação Espacial Internacional foi gradualmente crescendo, se tornando uma grande instalação permanente, contendo muito mais espaço habitável e equipamentos do que é possível carregar em vôos individuais que tenham que levar tudo de uma vez.

Artemis I

Um diagrama das fases da missão Artemis I. Créditos: NASA

Como o Artemis I usará pela primeira vez o novo foguete SLS e o Módulo de Serviço Europeu, será uma missão não tripulada completa para a órbita da Lua, permanecendo lá por 0.5 a 1.5 órbitas, retornando com a Orion e o módulo de serviço e a Orion reentrando e pousando na Terra após 26 a 42 dias. Isso permitirá testar todos os elementos que serão usados na primeira missão tripulada, a Artemis II.

Como parte dos testes, a Orion levará experimentos para medir a quantidade de radiação chegando ao interior da cápsula e de um novo colete a ser usado para proteção contra radiação (AstroRad), com o uso de dois manequins equipados com sensores internos nas posições de órgãos vitais mais sensíveis – um manequim com o AstroRad, outro sem, para verificar a diferença. Além da carga dentro do Orion, o Artemis I ainda levará 10 cubesats com uma variedade de experimentos, vindos de diferentes instituições pelo mundo:

  • ArgoMoon (Argotec / Agência Espacial Italiana – ASI): inspecionar o exterior da nave.
  • BioSentinel (NASA Ames): carregando fungos para examinar o efeito da radiação em longas permanências além de órbita baixa da Terra.
  • CuSP (Southwest Research Institute): teste para um sistema de monitoramento do clima espacial (fluxo de radiação e partículas vindos do vento solar).
  • EQUULEUS (Agência de Exploração Espacial Japonesa – JAXA / Universidade de Tóquio): mapear o ambiente de radiação ao redor da Terra e testar manobras de baixa propulsão em trajetórias para a Lua.
  • Lunar IceCube (Morehead State University): mapear gelo de água na superfície da Lua, a partir de uma órbita baixa.
  • LunaH-Map (Arizona State University): mapear a distribuição de compostos de hidrogênio (como água) a partir da órbita da Lua.
  • Near-Earth Asteroid Scout (NASA – centros Marshall, JPL, Johnson, Goddard e Langley): A primeira tentativa de usar uma vela solar como propulsão, irá observar um asteróide pequeno que passe perto da Terra (NEA – Near Earth Asteroid), além de demonstrar a tecnologia de uma missão de baixo custo com vela solar. O atual asteróide candidato a alvo, 2020, tem um tamanho comparável (18 m de diâmetro) ao da vela solar da sonda (14 m).
  • OMOTENASHI (JAXA): uma pequena sonda para pousar na Lua e monitorar a radiação neste ambiente.
  • LunIR (Lockheed Martin): demonstração de tecnologia para observação da Lua em infravermelho em uma plataforma de baixo custo.
  • Team Miles (Fluid and Reason): Demonstração de uma plataforma de baixo custo com sistemas de navegação, propulsão iônica e comunicação em espaço profundo.

Saiba mais em

Nosso artigo sobre o foguete SLS:

Nosso artigo sobre o Artemis I

Nosso artigo sobre as duas primeiras tentativas de lançamento e o que significa um scrub:

Nosso artigo sobre a escolha da segunda nave HLS para o pouso na Lua:

Transmissão ao vivo do transporte do foguete para o complexo de lançamento (começando dia 17 de março, 18:00 de Brasília):

Site oficial: https://www.nasa.gov/specials/artemis/

Blog oficial do Artemis: https://blogs.nasa.gov/artemis/

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