JWST deve durar 20 anos
No dia 24 de janeiro, após uma viagem de 29 dias, o telescópio espacial JWST chegou à sua órbita de operação, em torno do ponto Lagrangeano L2 do sistema Terra-Sol, a 1.5 milhão de km da Terra. Após o laçamento em 25 de dezembro, ele realizou com sucesso toda a complexa seqüência de abertura de suas muitas partes móveis, incluindo as duas mais difíceis: o escudo térmico e o espelho principal.
O tempo de vida do observatório é limitado pela quantidade de combustível (hidrazina) que ele carrega, que é usado para 2 fins: manobras de mudança de órbita, através de seus 2 motores principais, que queimam hidrazina, com tetróxido de dinitrogênio com oxidante e os pequenos motores, que usam hidrazina sem oxidante, que mudam a sua atitude (orientação e velocidade angular), embora o controle de atitude seja feito primariamente sem usar propelente, só com rodas de reação (que só consomem eletricidade gerada pelos painéis solares). O observatório foi desenhado com propelentes suficientes para 10 anos de operação. Mas após o lançamento, os dados de telemetria mostraram que o foguete Ariane 5 que fez o lançamento foi muito preciso, o que permitiu que o JWST usasse pouco propelente em suas manobras de correção de curso até entrar em sua órbita final. Esse baixo consumo significa que sobrou mais propelente para uso ao longo da missão, o que levou a uma estimativa de que ele poderá passar 20 anos operando.
Os passos seguintes para o JWST foram então terminar o resfriamento e alinhar com alta precisão os segmentos do espelho. O resfriamento é lento não apenas por o telescópio já estar muito frio (o que faz com que a potência irradiada para o espaço seja muito baixa, pois ela varia com a quarta potência da temperatura), mas também para evitar forçar muito alguns componentes mais delicados – por isso eles têm pequenos aquecedores, para que o resfriamento seja lento o suficiente. O passo de alinhamento dos segmentos do espelho usa observações de uma estrela e análise das imagens coletadas, para calcular como corrigir a forma do espelho primário.
Inicialmente, ao observar uma estrela brilhante e isolada, se via 18 imagens, uma formada por cada um dos 18 segmentos do espelho primário. Neste estágio, era como ter 18 telescópios independentes, todos formando uma imagem no mesmo instrumento. Cada imagem da estrela ficava em uma posição diferente, com um foco diferente:
Here is each spot of starlight labeled with the mirror segment that captured it.
— NASA Webb Telescope (@NASAWebb) February 18, 2022
Next: spot checks! Our team will adjust the mirror segments & update the alignment of our secondary mirror, focusing each dot. The dots will then be stacked on top of each other. #UnfoldTheUniverse pic.twitter.com/dxGO3i6Utw
Também foi possível fazer “selfies” usando um modo especial do instrumento NIRSPEC, para verificar que segmentos do espelho estavam iluminados a cada momento:
Bonus image! When it’s time to focus, sometimes you need to take a good look at yourself.
— NASA Webb Telescope (@NASAWebb) February 11, 2022
This “selfie” taken by Webb of its primary mirror was not captured by an externally mounted engineering camera, but with a special lens within its NIRCam instrument. #UnfoldTheUniverse pic.twitter.com/XtzCdktrCA
Usando estas imagens, foi possível ajustar o foco para cada segmento (movendo cada segmento independentemente até que a imagem dele estivesse no foco). O próximo passo era empilhar as imagens: mudar o apontamento de cada espelho para que todas as imagens caiam sobre o mesmo ponto do detector. Mas só empilhar ainda seria como simplesmente somar 18 imagens de telescópios independentes, cada uma com a resolução que cada pequeno “telescópio” (cada segmento do espelho, com 1.3 m) permite. O próximo passo era ajustar, com movimentos nanométricos, a posição dos espelhos de forma que as frentes de onda de todos coincidam. Esse passo é essencial para que o telescópio se torne um interferômetro, dando a ele efetivamente a resolução espacial de um espelho único de 6.5 m. E o resultado desejado foi obtido, com o instrumento NIRSPEC fazendo imagens no chamado limite de difração (o melhor possível de obter com um telescópio de 6.5 m):
Look how far we’ve come: We started with 18 scattered dots — 18 reflections of the same star, one from each of Webb’s primary mirror segments. These dots were then re-arranged, stacked, and fine-tuned, setting the stage for our first science images this summer! #UnfoldTheUniverse pic.twitter.com/N1KvmdoH7r
— NASA Webb Telescope (@NASAWebb) March 16, 2022
E nestas imagens pode-se notar uma peculiaridade do JWST: Enquanto na maioria dos telescópios ópticos as estrelas brilhantes aparecem com 4 pontas, o JWST faz estrelas de 8 pontas. Essas pontas, chamadas de cruz de difração, são o resultado de o telescópio ter elementos no caminho óptico que não são circulares. Em telescópios mais tradicionais, é comum se ver 4 pontas devido ao espelho secundário ser sustentado por uma estrutura em forma de cruz, que fica no meio do campo de visão, provocando difração com este formato. No JWST, o principal responsável pela forma de 8 pontas é o padrão em que os 18 segmentos estão dispostos.
A última tarefa agora é verificar e possivelmente ajustar o alinhamento usando os outros instrumentos, pois eles estão em partes diferentes do campo de visão. Após o alinhamento e resfriamento estar terminado, virá a fase de calibração, observando objetos astronômicos bem estudados, escolhidos para serem referência.
Veja mais sobre o JWST em nosso artigo:
Lançado o pico-satélite brasileiro PION-BR1
Em 14 de janeiro, foi lançado o primeiro satélite de uma startup brasileira, o PION-BR1. Ele foi um de 105 satélites carregados por um Falcon 9 da SpaceX, lançado da Base da Força Espacial de Cabo Canaveral. O PION-BR1 tem apenas 125 cm3 de volume (aproximadamente meio copo), sendo uma missão para teste das tecnologias de satélite desenvolvidas pela empresa PION Labs, de São Caetano do Sul (SP). A PION Labs foi formada por ex-alunos da Universidade Federal do ABC (UFABC) e Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), financiada pela Olimpíada Brasileira de Satélites (OBSAT, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, MCTI, organizada pela Universidade Federal de São Carlos, UFSCar, Agência Espacial Brasileira, AEB, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, INPE, e Universidade de São Paulo, USP), e foi a empresa contratada pela OBSAT para produzir os kits de hardware a serem distribuídos aos participantes da OBSAT. O recebimento dos sinais será feito pela organização autônoma e informal de radioamadores (Amsat-BR) e a Liga Brasileira de Radioamadores (Labre). O objetivo do projeto é capacitação em tecnologia para plataformas de satélites e comunicação com estações em Terra.
Realizado o primeiro teste de vôo do 14-X
Em 14 de dezembro, foi realizado o primeiro teste de vôo do motor hipersônico brasileiro 14-X. Com o nome inspirado pelo 14-Bis de Santos Dumont, combinado ao “X” comumente usado para designar aeronaves experimentais, este projeto da Força Aérea Brasileira visa desenvolver um veículo hipersônico com um motor scramjet integrado ao corpo do veículo. Scramjets, assim como ramjets, são motores a jato sem partes móveis, onde a captação e compressão do ar ocorre apenas pelo movimento do motor através do ar. Por este motivo, eles só funcionam se o veículo já estiver se movendo a velocidades muito altas (supersônicas, tipicamente), necessitando de um outro tipo de motor para dar a velocidade inicial (tipicamente, um motor a jato convencional ou um foguete). A diferença entre scramjets e ramjets é que scramjets têm fluxo supersônico do ar em seu interior, não gerando um cone de choque como nos ramjets, que desaceleram o ar até subsônico. Estes motores são vistos como a melhor possibilidade para viabilizar aeronaves (aviões ou mísseis) hipersônicas, voando a velocidades acima de Mach 5, através de motores a combustão que respiram ar (ou seja, sem usar foguetes, que são pouco práticos para reuso em aviões e só duram alguns minutos). O 14-X, iniciado em 2007 pelo Instituto de Estudos Avançados (IEAv), tem como objetivo ser uma plataforma hipersônica de grande altitude. Neste teste bem sucedido, o 14-X foi lançado pelo foguete suborbital Veículo Acelerador Hipersônico (VAH, baseado no foguete de sondagem VSB-30) a partir do Centro de Lançamento da Alcântara, no Maranhão. O 14-X foi acionado a 30 km de altitude, chegando a uma velocidade de Mach 6 a 50 km de altitude, e então teve um apogeu no espaço, a 160 km de altitude, em um vôo suborbital, caindo no oceano ao fim do vôo, a 200 km do ponto de lançamento.
Falharam os lançamentos de teste do Angara A5 e Simorgh
Dois novos foguetes sendo testados tiveram falhas em seu último lançamento: em 27 de dezembro, foi lançado o foguete Angara-A5, do cosmódromo de Plesetsk, na Rússia. O Angara em si funcionou, mas o segundo estágio, o Persei, falhou na sua segunda ignição, que deveria levar a carga de uma órbita baixa temporária para órbita geoestacionária e eles acabaram reentrando na atmosfera e caindo no oceano. Este era o último teste planejado para o Angara-A5, antes de começar a operar com cargas reais.
O Angara-A5 é o primeiro lançador grande (capaz de levar 24.5 t para órbita baixa, a 200 km de altitude) completamente desenvolvido e lançado pela Rússia. Isso porque todos os outros foguetes “russos” se originaram na União Soviética, incluindo elementos (fabricação ou lançamento) no que agora são outros países (Ucrânia e Casaquistão). Por isso, em 1992 foi iniciado o programa Angara, para desenvolver novos foguetes e plataformas de lançamento completamente na Rússia.
Em 30 de dezembro, o Irã lançou um foguete Simorgh, em sua primeira tentativa de alcançar órbita com este novo lançador. Mas, por motivos não publicados, ele não conseguiu atingir órbita, com sua carga de 2 satélites caindo no oceano. O Simorgh é o novo foguete iraniano, sucessor do Safir, para levar até 350 kg para órbita baixa, usando 3 estágios, os dois primeiros queimando UDMH (uma forma de hidrazina) com tetróxido de dinitrogênio e o terceiro estágio com motor de combustível sólido.
Saiba mais em
Status do JWST: https://www.jwst.nasa.gov/content/webbLaunch/whereIsWebb.html
PION-BR1: https://www.pionlabs.com.br/pion-br1
Teste do 14-X:
Lançamento do Angara-A5:
Teste do Simorgh e história do programa espacial iraniano: