Futuro Próximo: JWST

Um modelo em escala real do JWST, cercado por parte da equipe que trabalhou nele, no Centro de Vôo Espacial Goddard (NASA/GSFC), em Maryland, EUA. Créditos: NASA

Atualização: veja também nosso artigo sobre os instrumentos e as primeiras imagens científicas:

Atualização: veja nosso artigo sobre o lançamento:


Finalmente está próximo o lançamento do Telescópio JWST. Depois de 25 anos de preparação, o telescópio, que foi terminado nas instalações da Northrop Grumman, em Redondo Beach (subúrbio de Los Angeles, Califórnia), passou por todos os testes e foi transportado por navio (ele não cabe mais em aviões), passando pelo Canal do Panamá, até a Guiana Francesa. Ele será lançado em um foguete Ariane 5, do Centro Espacial da Guiana, a partir de 25 de dezembro de 2021. Esse é, de longe, o maior telescópio espacial já construído e permitirá muitas novas pesquisas em Astronomia, conseguindo observar no infravermelho objetos muito mais tênues do que foi possível até hoje.

Para que vai servir o JWST?

O JWST é o próximo grande observatório de uso geral a ser lançado ao espaço. “De uso geral” significa que, assim como a maior parte dos observatórios em terra, ele não está restrito a ser usado para um único (ou poucos) projetos específicos (como, por exemplo, telescópios dedicados a procurar asteróides próximos da Terra, ou para detectar planetas extrassolares). Pesquisadores já podem fazer suas propostas de observação com o JWST (chamados, em astronomia, de “pedidos de tempo”, porque se está solicitando usar o telescópio por um certo número de horas), para qualquer projeto de pesquisa que pode se beneficiar de suas observações.

O objetivo de colocar o telescópio no espaço é estar livre da atmosfera da Terra, que dificulta, ou mesmo impede completamente, vários tipos de observações. Telescópios operam coletando luz, cada um operando em uma certa faixa do espectro eletromagnético. Por exemplo, alguns operam com ondas de rádio (por isso chamados radiotelescópios), outros com luz infravermelha, outros com luz visível, outros com luz ultravioleta. O JWST é um telescópio predominantemente para luz infravermelha, sendo capaz de detectar luz com comprimentos de onda entre 0.6 µm a 28 µm. Grande parte dessa faixa é impossível de ser observada de terra, porque a luz é absorvida pela atmosfera e parte dela pode ser observada de terra, mas a atmosfera atrapalha, impedindo a observação de objetos muito tênues e limitando a resolução que pode ser atingida, por causa de turbulência na atmosfera (como a dificuldade para ler claramente um texto que esteja no fundo de uma piscina).

Estando no espaço e com o tamanho do JWST, com 6.5 m de diâmetro, vai ser possível observar objetos muito mais tênues do que já foi possível e com uma resolução melhor do que qualquer outro telescópio de infravermelho já teve. Com essas características, as principais áreas de estudo que devem se beneficiar do JWST são

  • O início do universo: devido à expansão do universo e ao efeito Doppler, a maior parte da radiação emitida pelas galáxias mais distantes, a uns 13 bilhões de anos-luz de distância (portanto, emitida há 13 bilhões de anos) está no infravermelho, podendo ser observada com o JWST.
  • Evolução de galáxias: como vai poder observar as galáxias mais antigas e tênues, estas poderão ser comparadas com as mais novas, para infornar como galáxias evoluem no tempo.
  • Vida das estrelas: como no infravermelho é possível observar melhor através das nuvens de gás e poeira que ocultam as estrelas mais jovens, o JWST vai trazer mais dados sobre a formação e o início da vida de estrelas.
  • Planetas: os gases comuns em atmosferas planetárias absorvem luz em muitos comprimentos de onda no infravermelho (exatamente o motivo de não ser possível observar a partir da Terra) e por isso os instrumentos poderão ser usados para medir a composição química das atmosferas de outros planetas, tanto no Sistema Solar como fora (os exoplanetas).

Atualização: Veja mais sobre os instrumentos do JWST em nosso outro artigo:

Como é o telescópio?

Parte do JWST durante sua construção, no Centro Espacial Goddard, da NASA. Créditos: NASA / Chris Gunn.

Sempre que o JWST é mencionado, há comparações com o Telescópio Espacial Hubble (HST, na sigla em inglês). O que não é estranho, já que além de ser o mais famoso telescópio espacial, o Hubble é o observatório mais importante em existência. O HST, em operação desde 1991, trouxe dados revolucionários à Astronomia, impossíveis de serem obtidos por qualquer outro telescópio até hoje. Ele consegue observar, de muitas formas diferentes (graças aos seus muitos instrumentos), luz do ultravioleta ao infravermelho (incluindo luz visível) com uma sensibilidade e resolução espacial em luz visível e ultravioleta insuperáveis por qualquer outro telescópio até hoje. Ele foi (e ainda é) extremamente importante em todas as áreas da Astronomia: cosmologia (estudo das origens do universo), evolução de galáxias, astrofísica estelar e ciências planetárias. Por esse motivo ele é também o observatório usado de forma mais eficiente: ele opera 24 h por dia, todos os dias do ano (a não ser quando tem que parar por problemas técnicos) e todas as observações são planejadas muito cuidadosamente, ao nível de decidir o que ele vai estar fazendo a cada minuto, para que praticamente não passe tempo nenhum ocioso. Por isso também ele é o telescópio mais concorrido: embora qualquer pessoa no mundo possa fazer uma proposta para o usar, são muito poucos os projetos que são aceitos (por volta de 1 a cada 20), pois não há tempo suficiente para ele fazer tudo que é proposto. É como um vestibular ou concurso muito concorrido. E a concorrência só não é maior que esses “20 candidatos por vaga” porque a maioria dos astrônomos que gostaria de o usar nem chega a tentar, por saber que a chance de ser escolhido é muito baixa.

Como o JWST se compara ao HST? Bem, apesar de ser apresentado como “sucessor do Hubble”, o JWST não o é exatamente. Isso porque o JWST só vai ser capaz de observar luz infravermelha (e um pouco de luz visível, vermelha). Ele não vai ser capaz de observar a maior parte do espectro visível, nem ultravioleta, como o Hubble consegue, mas vai ser capaz de observar em comprimentos de onda no infravermelho que o Hubble não alcança. Com um diâmetro de 6.5 metros, comparado aos 2.4 metros do Hubble, o JWST será muito mais capaz que o Hubble no infravermelho.

A outra grande diferença entre o JWST e o HST é onde ele vai ficar: enquanto o Hubble está em órbita baixa da Terra (550 km da superfície) e foi feito para ser acessível para manutenção por astronautas no ônibus espacial, o JWST vai estar muito mais longe: ele vai ser colocado em um dos chamados pontos Lagrangeanos do sistema Terra-Sol. Esse lugar, do outro lado da Lua, a 1.5 milhões de km da Terra (como comparação, a Lua está a uns 383 mil km), é longe demais para que haja qualquer possibilidade de manutenção. Ele foi escolhido porque nessa região o Sol, a Terra e a Lua estão sempre na mesma direção, o que é importante para o JWST, que precisa manter seu escudo solar apontado para os 3, para o proteger da radiação visível e infravermelha, que esquentaria o telescópio. Isso é necessário porque para operar eficientemente no infravermelho, é importante que a temperatura do JWST seja mantida muito baixa (abaixo de 50 K, ou -223 °C) e seja muito estável. Toda a grande estrutura do lado “de baixo” do JWST (de baixo nas fotos mostradas aqui) é um escudo de 5 camadas, para refletir a energia radiativa do Sol, Terra e Lua, mantendo o telescópio muito frio.

Veja nesse vídeo como deve ser toda a complexa seqüência de lançamento e abertura do telescópio.

Como foi construído?

O JWST é formado de dois elementos principais: o telescópio e a nave (telescope element e spacecraft element). A parte do telescópio contém o telescópio em si e os instrumentos científicos que são acoplados a ele. A parte da nave contém os escudos térmicos, painéis solares, propulsão (para ajustar a órbita), motores e rodas de reação para apontamento (para apontar para o local do céu a ser observado, com precisão muito alta), comunicações (para receber comandos da Terra e mandar para a Terra os dados coletados) e os computadores que controlam toda a operação. Estes dois segmentos de características tão distintas foram construídos separadamente: o segmento da nave foi feito pela empresa Northrop Grumman, principalmente em suas instalações em Redondo Beach (subúrbio de Los Angeles). O segmento do telescópio foi construído nas instalações do Centro de Vôo Espacial Goddard, da NASA (GSFC, na sigla em inglês), com contribuições de várias outras instituições, principalmente no desenvolvimento dos instrumentos, incluindo Lockheed Martin, Universidade do Arizona, Agência Espacial Européia (ESA), Agência Espacial Canadense (CSA), Airbus, Carl Zeiss (Alemanha), Centro de Tecnologia de Astronomia do Reino Unido, Astrium (Alemanha), JPL (Laboratório de Propulsão a Jato, da NASA, operado pela universdidade California Institute of Technology) e Universidade de Montréal. Grande parte do delicado trabalho de integração (juntar todos os componentes de origens diferentes) do telescópio foi feita nas instalações do GSFC pela empresa L3 Harris. Após o elemento do telescópio finalmente ter sido concluído e testado, em 2017, ele foi embalado e transportado de avião para o Centro Espacial Johnson, (JSC) da NASA, em Houston (Texas), para seus testes de termovácuo. Estes são os testes em que o equipamento é colocado em uma câmara de vácuo, fria, e operados lá dentro, para verificar se tudo funciona em um ambiente como o que vai ser encontrado no espaço. Devido ao tamanho de todo o elemento do telescópio, essa parte teve que ser executada nas grandes câmaras de vácuo do JSC, que foram construídas no programa Apollo para testar componentes grandes como o módulo lunar.

Container contendo o elemento do telescópio, em sua chegada ao Johnson Space Center, em Houston, Texas. Ao fundo, à esquerda (onde está o logotipo da NASA), pode se ver a porta da câmara de vácuo a ser usada nos testes. Pode-se ver também os equipamentos de ar-condicionado e filtragem do ar que fazem parte do container. Créditos: NASA / Chris Gunn.

Após passar por todos os testes no JSC, o telescópio foi embalado novamente, dessa vez para ser transportado para as instalações da Northrop Grumman, em Redondo Beach, para ser integrado ao elemento da nave.

Container com o elemento do telescópio sendo descarregado de um avião C5 Super Galaxy no Aeroporto Internacional de Los Angeles, para ser transportado para as instalações da Northrop Grumman, em 2018. Créditos: NASA / Michael McClare / Sophia Roberts / Chris Gunn / Michael Menzel.

Agora que o telescópio terminou de ser integrado à nave e ambos passaram por todos os testes, o JWST completo foi preparado para o transporte para o lançamento, que foi marcado para a partir de 22 de dezembro de 2021. Como o conjunto todo é muito grande para ser transportado de avião, ele seguiu de navio, passando pelo Canal do Panamá, para chegar ao Centro Espacial Guiana, em Kourou, na Guiana Francesa. Ao contrário do Hubble, ou de qualquer outra missão de grande porte da NASA, ele não será lançado dos EUA, pois parte da parceria da Agência Espacial Européia (ESA) na missão será prover o lançamento, através de um foguete Ariane 5. Os elementos do foguete chegaram ao centro de lançamento, vindos da Europa, de navio, no dia 3 de setembro de 2021.

Como ele vai ser operado? Quem vai poder o usar?

Assim como o Hubble, o JWST será operado pelo Space Telescope Science Institute (STScI), localizado no campus da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, Maryland. O STScI terá as tarefas de selecionar os projetos que vão usar o telescópio, agendar as observações, gerar todos os comandos para operar o telescópio, obter os dados, baixar os e processar os dados e manter o funcionamento do observatório e do arquivo de observações. Ao contrário do Hubble, que está em órbita baixa da Terra e por isso pode se comunicar praticamente o tempo todo, através de satélites da rede TDRSS e estações de Terra, o JWST, estando muito mais longe (mais longe que a Lua), vai se comunicar mais esporadicamente, através da Deep Space Network (DSN), operada pelo centro JPL da NASA. A DSN é uma rede formada por 3 estações espalhadas a aproximadamente 120° de longitude uma da outra, em Goldstone (Califórnia), Madrid (Espanha) e Canberra (Austrália), cada uma contando com várias grandes antenas parabólicas, de até 70 m de diâmetro, para conseguir se comunicar com sondas distantes (o que se chama deep space), o que inclui todas as sondas mandadas para outros planetas e até as Voyager, que já estão fora do Sistema Solar. Apesar de ter muitas antenas, por ser responsável pela comunicação com dezenas de missões, a DSN não pode ter uma antena sempre apontando para o JWST.

O complexo de comunicações de espaço profundo de Canberra, em 2008. Créditos: Ryan Wick.

Também assim como com o Hubble, o JWST estará aberto à comunidade astronômica de todo o mundo, gratuitamente. Mas como não é possível atender a todos os interessados em usar o telescópio (é só um telescópio, para milhares de astrônomos pelo mundo), a escolha de quem vai observar e por quanto tempo é feita por uma comissão de especialistas do STScI e de outras instituições. Uma vez por ano, é aberto o período de pedidos de tempo, que são as propostas escritas pelos astrônomos interessados descrevendo que observações querem fazer com o telescópio, quanto tempo elas vão gastar, como serão feitas (que instrumentos usar, em que configurações) e qual é a justificativa: qual é a “grande questão” que pode ser resolvida com essa observação e porque ela precisa desse telescópio (ao invés de algum outro observatório qualquer). Como o JWST (assim como o Hubble) é uma plataforma de características únicas, haverá muito interesse nele, o que resulta em muito mais propostas do que é possível conceder. Tipicamente, para o Hubble, o número de propostas submetidas é 10 a 30 vezes maior do que é possível conceder (mesmo com o telescópio operando praticamente 24 horas por dia, 365 dias por ano). Vale mencionar que o STScI tem uma inovação recente em relação à maioria dos observatórios astronômicos: as propostas de observação submetidas são anonimizadas antes de serem avaliadas pela comissão (isto é, a comissão não sabe os nomes dos autores das propostas), para evitar vieses. Um dos resultados da adoção dessa medida é que o número de propostas concedidas a mulheres passou a ser a maioria, algo que nunca tinha acontecido antes da anonimização.

Por que ele atrasou tanto e está tão acima do orçamento original?

O projeto foi proposto em 1996, seguindo o grande sucesso do Hubble, como um grande passo para um próximo telescópio espacial muito maior e mais capaz. Foram definidos os principais parâmetros: um telescópio de 8 m de diâmetro para observar no infravermelho, a ser colocado no ponto Lagrangeano L2 (portanto sem possibilidade de manutenção por astronautas). O ambicioso projeto foi estimado, seguindo a política “faster, better, cheaper” (“mais rápido, melhor e mais barato” que dominou a NASA na década de 1990, durante a administração de Daniel Goldin), como realizável em 10 anos a um custo de $500 milhões. Como então ele chegou a 2021 a um custo de cerca de $10 bilhões? Houve dois principais fatores:

  1. A mudança da contabilidade do custo de missões para “full cost accounting”, o que significa incluir na conta da missão muitas categorias de gastos que antes ficavam na conta da operação dos centros da NASA onde o trabalho era executado.
  2. O JWST, como o Hubble, é dependente de conseguir construir os melhores instrumentos astronômicos de sua classe, em uma versão robusta o suficiente para que estes delicados instrumentos sobrevivam ao lançamento e ao ambiente do espaço, funcionando por anos seguidos sem receber manutenção – ao contrário de observatórios de terra, onde há uma equipe constantemente desmontando e reparando os instrumentos. E para a proposta do JWST ainda eram necessários dois grandes novos passos: fazer um espelho segmentado dobrável, para ser aberto em órbita (pois o espelho é grande demais para caber em um foguete sem ser dobrado), o que requer altíssima precisão no posicionamento dos segmentos após a abertura e conseguir ter um grande isolamento térmico, para poder observar objetos muito tênues no infravermelho. Ao contrário do Hubble, que teve o telescópio e a nave derivados de telescópios espaciais já existentes (e, portanto, cujo desenvolvimento já tinha sido pago) usados pelo Departamento de Defesa (eram satélites espiões), o JWST teve que desenvolver estas tecnologias cruciais a partir do zero. As primeiras estimativas de tempo e custo para resolver todos estes desafios tecnológicos eram excessivamente otimistas, subestimando o trabalho necessário para tornar prontas para vôo várias novas tecnologias.

Conforme detalhado em uma análise publicada na Nature em 2006, antes ainda de o telescópio atingir o Preliminary Design Review (PDR – revisão preliminar do desenho, uma grande e complexa avaliação de todo o projeto para determinar se ele tem um plano viável e concreto para ser realizado, necessária para autorizar a construção), já estava bem claro que as estimativas iniciais de custo estavam muito erradas. Isso foi atribuído em parte à pressão política do “faster, better, cheaper”, em que aceitava-se um risco maior para fazer as missões serem mais baratas. Influenciadas por essa pressão por baixo custo, propostas da época eram excessivamente otimistas, não dando tempo e orçamento suficientes para todos os testes e contingências (alterações no projeto resultantes de testes ou simulações indicarem que o projeto atual não vai atender a todos os requisitos, ou simplesmente decorrentes de outros atrasos). Havia uma certa inclinação na época a subestimar os custos de propostas para conseguir que o Congresso as aprovasse, contando que quando faltasse dinheiro no futuro se conseguiria extensões de orçamento e prazo, para não perder o trabalho já realizado.

No começo da década de 2000, depois da perda de duas missões seguidas para Marte (Mars Polar Lander e Mars Climate Orbiter) e do observatório espacial Wide-Field Infrared Explorer, todos em 1999, a NASA a começou a abandonar o “faster, better, cheaper” e retomar sua estratégia tradicional de testar e revisar intensamente antes do lançamento, voltando a maiores tempos de preparação e maiores custos. Podemos notar que foi uma decisão de diminuir o número de testes antes do lançamento que resultou em não ter sido detectado que o espelho principal do Hubble foi feito com a forma errada, algo que teria inutilizado o observatório, caso não tivesse sido possível corrigir o problema com a instalação por astronautas de novos elementos ópticos. E com o JWST não haverá chance de visitas. Ele tem que funcionar do jeito que for lançado. Por isso, muitos testes são necessários para ter certeza de que tudo vai funcionar.

Mas mesmo com a estimativa mais realista de 2008, depois desse ponto novos problemas encontrados no desenvolvimento e teste das tecnologias mais difíceis e cruciais do telescópio levaram a um gradual aumento no custo e atrasos no lançamento. Em 2011, após uma revisão independente do projeto e o Congresso decidir cortar $1.9 bilhões do orçamento de ciência da NASA para 2012, o Congresso propôs cancelar o JWST, após $3 bilhões gastos até então, faltando (pela estimativa da época) mais $3.5 bilhões. O que resultou em enorme reação da comunidade astronômica internacional. O observatório havia sido apontado como prioridade para a astronomia em dois levantamentos seguidos em que a comunidade define os objetivos e prioridades para a pesquisa na década se iniciando (os decadal surveys, de 1990 e 2000). Esta pressão fez Congresso mudar de ideia e aprovar continuar seu financiamento, até um teto de $8 bilhões.

Já nessa época havia também críticas por parte da comunidade astronômica, que embora reconhecendo o mérito do JWST, considerava que o custo estava sendo alto demais, pois ele estava consumindo todos os recursos para astronomia espacial, com outras missões sendo adiadas ou canceladas para haver dinheiro para o JWST (um artigo de 2010 na Nature tinha o título “JWST: o telescópio que comeu a Astronomia”, em nossa tradução). A principal resposta dada pelos astrônomos defendendo a continuação do projeto é que um telescópio deste nível é intrinsecamente muito caro. Uma estimativa de 2015 para considerar o custo total do Hubble (considerando “full cost accounting” e todas as visitas de ônibus espaciais para manutenção) calculou $11.3 bilhões, até 2015 – embora deva ser notado que naquele ponto o Hubble já tinha rendido 24 anos de observações. Portanto, o JWST não seria sem precedentes em custo.

Depois deste ponto, os aumentos e atrasos foram predominantemente decorrentes de testes com o telescópio, a nave e os dois integrados, que mostraram problemas que precisavam de mais trabalho para serem resolvidos. Neste estágio, estes eram em geral testes para verificar se todos os elementos eram robustos o suficiente para resistir ao lançamento e o ambiente no espaço. A essa altura, todo o trabalho e custo até o momento fazem com que mais cuidado ainda seja tomado, para ter mais certeza de que tudo vai funcionar, para não perder tudo depois do lançamento.

A última notícia (na data em que escrevemos) é que houve mais um adiamento. O lançamento estava marcado para 18 de dezembro de 2021. Mas no dia 22 de novembro, enquanto a empresa Arianespace estava abastecendo o combustível do JWST, uma braçadeira que o segurava ao adaptador do foguete escapou, “causando vibração em todo o observatório” (em nossa tradução). A NASA montou um comitê de investigação da anomalia, para examinar e testar o JWST, que determinou que não houve danos a ele. Isso atrasou o lançamento, para o dia 22 de dezembro. Depois de um problema com um cabo de comunicações entre o telescópio e o foguete ser resolvido, o que adiou para dia 24 de dezembro, e da previsão do tempo adiar por mais um dia, a data atual para o lançamento é 25 de dezembro.

De onde veio o nome e porque ele pode ser um problema?

O observatório, que originalmente era Next Generation Space Telescope, foi renomeado em 2002, em homenagem a James Webb, que foi o segundo administrador da NASA durante o período crítico do programa Apollo, de 1961 a 1968. Mais do que “apenas” administrar a enorme expansão da agência e todo o trabalho necessário para que o programa Apollo tivesse sucesso, Webb costuma ser creditado por sua grande habilidade política, necessária para negociar com o Congresso ao longo destes anos para manter o suporte e financiamento necessários para o sucesso do Apollo, principalmente após a investigação do desastre da Apollo I. É bom lembrar que Webb não era cientista ou engenheiro, mas um político de longa carreira.

O problema veio à tona em 2021, quando mais de 1200 cientistas assinaram uma petição pedindo que o observatório fosse renomeado, devido às acusações de que Webb perseguia gays e lésbicas nas décadas de 1950 e 1960. A NASA abriu uma investigação, mas o resultado foi bastante decepcionante: apenas uma declaração de apenas uma frase do atual administrador, Bill Nelson, dizendo que “não encontraram indícios que suportem uma mudança de nome”. Não foi divulgado um relatório da investigação, nem muitos outros detalhes além de afirmar que não encontraram evidências nos documentos que puderam analisar, mas a análise foi limitada a documentos que tinham sido digitalizados no passado, porque alguns arquivos e bibliotecas relevantes estão fechados devido à pandemia de COVID-19. Após este resultado, a comunidade astronômica ainda está considerando como responder. Não é viável boicotar um telescópio único que durante duas décadas consumiu uma fração enorme de todos os recursos da Astronomia, ao custo de outros projetos. Uma das propostas é elaborar uma declaração sobre as suspeitas a ser incluída nas citações ao telescópio em artigos científicos. Outra é boicotar o nome, usando apenas algum nome alternativo para se referir a ele. Uma astrônoma do planetário Adler, Lucianne Walkowicz, já renunciou à sua posiçao no Astrophysics Advisory Committee da NASA, em protesto.

É por este motivo que neste artigo só usamos o nome JWST. Se algum novo nome for adotado (mesmo que não oficialmente), nós o substituiremos neste e outros artigos no blog.

Saiba mais em

https://www.nasa.gov/feature/goddard/2021/nasa-s-james-webb-space-telescope-has-completed-testing

Site oficial: https://www.jwst.nasa.gov/

Nosso artigo sobre o lançamento:

Atualização: Veja como foi o processo de alinhamento dos segmentos do espelho em

Nosso artigo sobre os instrumentos científicos:

Related Post

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *