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Está marcado para dia 29 de agosto o primeiro lançamento do maior foguete da atualidade, o SLS – Space Launch System.
Atualização (29 de agosto): Estão examinando por que a válvula de escape de um dos motores não está com a temperatura certa, e concluíram que não vai dar tempo de resolver a tempo de lançar hoje. Próxima oportunidade: sexta-feira, 2 de setembro.
O foguete já está na plataforma de lançamento 39B do Kennedy Space Center da NASA. No dia 22 de agosto, foi concluída a revisão (Flight Readiness Review), e o foguete foi aprovado para o lançamento dia 29 (“Go for launch”). A janela de lançamento, de 2 horas, começa às 9:33 (horário de Brasília). A transmissão oficial ao vivo começa 2h antes, às 7:30 (horário de Brasília):
Para que ele será usado?
Com a coincidência da grande expectativa para o primeiro vôo do SLS e a grande expectativa para a primeira missão para a Lua com o programa Artemis, é comum que os dois sejam confundidos. Mas são projetos distintos: Artemis é o programa que vai levar humanos de volta à Lua, pela primeira vez desde 1972, desta vez para estabelecer uma estação orbital e uma base permanente (veja mais em nosso artigo). Para conseguir carregar as grandes cargas necessárias, o programa Artemis vai usar o foguete SLS.
Mas o SLS não existe só para o Artemis. Ele é o atual grande veículo para todas as missões nas próximas décadas que exijam levar cargas muito grandes ou a velocidades muito altas: a capacidade de um foguete determina quanta energia cinética ele consegue dar à carga, o que pode ser uma carga de muita massa em uma trajetória de velocidade relativamente baixa ou uma carga de baixa massa a uma alta velocidade. O que inclui as missões para a Lua com o programa Artemis, as primeiras missões tripuladas para Marte e grandes veículos não tripulados para destinos muito distantes, como o que pousaria na lua Europa de Júpiter – notando que não é a distância em si que exige maior foguete, mas o maior foguete permite lançar com uma velocidade maior, cortando vários anos do tempo de viagem para o Sistema Solar além de Marte.
As origens do SLS vêm de programas anteriores: na década de 2000, o grande veículo da NASA era o Ônibus Espacial, capaz de levar para órbita baixa da Terra uma grande tripulação na cabine (até 11 astronautas, mais até 24 t em seu compartimento de carga) e estava sendo usado na construção da Estação Espacial Internacional e na manutenção do Telescópio Espacial Hubble – como comparação, o veículo Crew Dragon da SpaceX só carrega até 4 tripulantes em vôos curtos e um Ônibus Espacial tinha em seu compartimento de carga volume e capacidade para carregar 2 Crew Dragon inteiros, com seus porta-malas (trunks). Com a sua iminente aposentadoria, em 2011, a nova estratégia adotada pela NASA foi delegar o que seriam as missões simples (pequenas cápsulas de carga ou tripuladas até órbita baixa) para empresas privadas e criar um novo veículo da NASA para cargas muito grandes, do porte que só operou na época do programa Apollo (o Saturn V). Para economizar tempo, custo e risco no desenvolvimento, seriam adotadas tecnologias derivadas e até o próprio equipamento dos dois grandes programas anteriores, Apollo e Ônibus Espacial. O primeiro resultado foi o programa Constellation, proposto em 2004, que teria dois modelos de foguetes, o Ares V (para grandes cargas não tripuladas) e o Ares I para apenas carregar a cápsula Orion (a ser desenvolvida) para encontrar em órbita baixa com outras naves lançadas pelo Ares V (como um módulo de serviço ou de pouso na Lua). Em 2010, o Congresso e o presidente decidiram cancelar o programa Constellation e no orçamento de 2011 foi proposta uma reformulação do conceito, que era então o SLS.
Como é o SLS?
Como herança do Constellation, o SLS adotou o uso de conceitos e equipamentos do Apollo, Ônibus Espacial e do foguete Delta IV, mantendo a nave Orion como compartimento tripulado para viagens longas o suficiente para alcançar a Lua. Mas ao invés de foguetes diferentes para carga e tripulação, se trata de um foguete maior, levando os dois ao mesmo tempo. Os elementos do SLS podem ser vistos, a grosso modo, como: uma cápsula para a tripulação, derivada do desenho da Apollo, no topo de todos os elementos de propulsão do Ônibus Espacial (o tanque externo, os boosters sólidos e os motores, mas sem o avião espacial). No topo vai um segundo estágio, derivado do segundo estágio do foguete Delta IV. Ao longo de 3 gerações, o SLS vai receber mudanças, aumentando sua capacidade: bloco 1 (capacidade de 70 t para órbita baixa), bloco 1B (105 t) e bloco 2 (130 t):
1. Core Stage
O estágio principal é derivado diretamente da propulsão dos Ônibus Espaciais. É o corpo laranja contendo os tanques de hidrogênio e oxigênio. Ao contrário do tanque do Ônibus Espacial, o do SLS contém motores: 4 motores RS-25D, também conhecidos como SSME – Space Shuttle Main Engines, pois são os motores usados nos Ônibus Espaciais. E não são apenas motores do mesmo modelo do Ônibus Espacial, mas são os próprios motores que já foram ao espaço muitas vezes, que estavam armazenados desde 2011. Os 4 motores para o Artemis I já foram ao espaço 3, 4 , 6 e 12 vezes. Foram feitas apenas pequenas modificações, principalmente modernizando o computador que os controla, aumentando a proteção térmica, por causa da proximidade maior dos boosters e aumentando o nível de potência – no SLS os motores serão usados apenas uma vez, então não precisam sobreviver para reuso. Depois de gastos 16 dos motores herdados do Ônibus Espacial, serão usados novos RS-25E, produzidos também pela Aerojet Rocketdyne, com mais alguns ganhos de performance, o que vai levar a capacidade para órbita baixa de 95 para 105 t. A fabricação e montagem do estágio principal foi feita na Michoud Assembly Facility da NASA, na Louisiana, principalmente pela Boeing.
2. Solid Rocket Boosters (SRBs)
Também vindos dos Ônibus Espaciais, são os dois foguetes auxiliares, presos do lado do estágio principal, que queimam combustível sólido. Eles são versões expandidas, com 25% a mais de empuxo, por usar 5 segmentos (ao invés dos 4 usados para o Ônibus Espacial) e sem ter que carregar o peso dos pára-quedas para recuperação. São construídos principalmente com componentes que foram usados no programa do Ônibus Espacial, para os primeiros 8 vôos (bloco 1 e bloco 1B). Para o bloco 2, será usada uma nova versão, atualmente em desenvolvimento pela Northrop Grumman, com a principal diferença sendo a estrutura ser mais leve, de materiais compósitos, ao invés de aço, o que, junto com o novo segundo estágio, vai levar a capacidade de carga do SLS bloco 2 para 130 t.
3. Interim Cryogenic Propulsion Stage
Para o segundo estágio, os primeiros vôos vão usar o Interim Cryogenic Propulsion Stage (ICPS), produzido pela Boeing, quase idêntico ao Delta Cryogenic Second Stage (DCSS) usado no foguete Delta IV desde 2002, usando hidrogênio e oxigênio líquidos, com um motor RL10B-2 no primeiro vôo e RL10C-2 nos próximos 2. Produzido pela Aerojet Rocketdyne – Pratt & Whitney, as origens do RL-10 estão na década de 1960, usado no Centaur A (segundo estágio do foguete Titan) e no Saturn I. Para o SLS bloco 1B em diante, todo o segundo estágio será substituído pelo Exploration Upper Stage (EUS), uma versão maior e com mais empuxo, atualmente em desenvolvimento, que terá 4 motores RL-10C-3, futuramente trocados por RL10C-X. Esta mudança de segundo estágio, junto com a troca dos SRBs, levará a capacidade do SLS de 105 para 130 t.
Orion Multi-Purpose Crew Vehicle
Estritamente falando, o último estágio a ser usado nas missões Artemis, o veículo Orion, não é parte do SLS – ele é a carga sendo carregada pelo SLS nestas missões. Mas como é o terceiro estágio que vamos ver em uso nessas primeiras missões, vamos falar dele aqui. Em usos não tripulados do SLS, os módulos de comando e serviço Orion seriam substituídos por outra carga – por exemplo, o veículo da missão Europa Lander, ainda em fase de formulação.
Desenhado para uso em missões tripuladas que vão além de órbita baixa da Terra, a tripulação ocupa uma cápsula cônica, o Módulo de Comando (CM), construído pela Lockheed Martin, uma versão maior e modernizada das cápsulas Apollo, para levar tipicamente 4 astronautas (cabendo até 6), tipicamente por 21 dias, ao invés dos 3 astronautas da Apollo por 14 dias. O Módulo de Comando é a única parte que entra na atmosfera da Terra na volta, pousando no oceano. Já o Módulo de Serviço Europeu (ESM), que vai acoplado a ele, contém um motor, tanques de combustível e oxidante (aerozina e tetróxido de dinitrogênio) e painéis solares. Este é uma contribuição da ESA e é construído pela Airbus Defence and Space. O motor AJ10 do ESM, produzido pela Aerojet Rocketdyne, também tem uma longa história: versões dele foram usadas desde a década de 1960, incluindo o módulo de serviço Apollo e o sistema de manobra orbital do Ônibus Espacial, além de várias versões de Vanguard, Atlas, Thor e Titan. O motor usado no Artemis I já foi ao espaço em 19 vôos do Ônibus Espacial, desde 1984!
Na figura abaixo, pode-se notar que a cápsula não é tão maior e o módulo de serviço é mais compacto, mas o volume habitável é 50% maior, o que se deve à redução no volume ocupado por instrumentos e outros equipamentos e por gerar eletricidade por painéis solares – na Apollo eram usadas células de combustível, que necessitavam de grandes tanques para hidrogênio e oxigênio.
Como detalhado em nosso artigo sobre o Artemis, nesse programa o uso das Orion seria apenas como veículo para transitar entre a Terra e a Lua, pois os astronautas terão um espaço muito maior na estação que vai ficar orbitando a Lua e na base permanente na superfície.
Este vídeo mostra o processo de montagem do SLS para o Artemis I
Saiba mais em
Nosso artigo sobre o Programa Artemis:
Site oficial: https://www.nasa.gov/exploration/systems/sls/index.html