Está marcada para 16 de outubro de 2021 a primeira tentativa de lançamento da missão Lucy, a partir da base da Força Espacial de Cabo Canaveral, na Flórida, em um foguete Atlas V 401, da United Launch Alliance. A primeira tentativa será às 05:34 da manhã (hora da Flórida, 06:34 na hora de Brasília), e poderá ser visto ao vivo em
Para onde vai a Lucy?
A Lucy está partindo para uma missão de 12 anos, um longo tour passando por 8 asteróides, mais do que qualquer outra missão no passado:
- 20 de abril de 2025: 52246 Donaldjohanson – 4 km de diâmetro, do cinturão principal de asteróides, tipo C (“carbonáceo”), membro da família Erígone (o resultado de uma colisão ha 130 milhões de anos).
- 12 de agosto de 2027: 3548 Eurybates e seu satélite, Queta, um troiano tipo C, de 64 km de diâmetro, o maior membro da família Eurybates, a mais bem estabelecida família entre os troianos.
- 15 de setembro de 2027: 15094 Polymele – asteróide troiano tipo P (um tipo mais raro, possivelmente formado por silicatos com materiais orgânicos) de 21 km, em uma órbita bastante inclinada, possivelmente fragmento de uma colisão.
- 18 de abril de 2028: 11351 Leucus – troiano de 34 km de diâmetro, tipo D (um tipo mais raro de superfície mais escura e avermelhada, possivelmente silicatos com mais orgânicos e água), e rotação extremamente lenta (466 h).
- 11 de novembro de 2028: 21900 Orus – troiano de 51 km, já foi classificado tanto como tipo C como tipo D, e possível binário.
- 2 de março de 2033: 617 Patroclus e seu satélite, Menoetius – o mais peculiar, o único troiano do L5 a ser visitado, é um binário de dois componentes quase iguais, de 113 e 104 km com uma separação de 680 km, tipo P.
A Lucy não vai entrar em órbita nem pousar em nenhum dos alvos. A missão é só uma série de passagens (flybies), pois seria necessário muito combustível para frear a sonda ao chegar a cada asteróide, e depois acelerar para sair de órbita, em direção ao próximo (como feito pela missão Dawn, da NASA). Portanto, assim como na missão New Horizons, que só passou por Plutão, Caronte e suas outras Luas, cada passagem da Lucy vai ser um período de apenas algumas horas próximo a cada alvo, tendo que coletar observações o mais rápido possível. A missão foi planejada com uma trajetória bastante complexa, para que ela encontrasse todos estes asteróides sem ter que fazer grandes manobras entre eles, usando apenas a gravidade dos planetas (por isso as várias passagens pela Terra). Isso porque cada manobra que tenha que ser feita com os motores consome uma grande massa de propelente, que é bem limitada.
Mas mais do que isso, o grande diferencial da Lucy é que vai ser a primeira visita aos asteróides troianos.
O que são asteróides troianos e por que são interessantes?
São chamados troianos os asteróides que orbitam o Sol em uma de duas regiões especiais na órbita de Júpiter, em torno dos chamados pontos Lagrangeanos, L4 e L5, que ficam 60° à frente de Júpiter (L4) e 60° atrás de Júpiter (L5). Devido à grande massa de Júpiter, sua gravidade perturba a órbita de corpos orbitando o Sol próximos a ele. Na maior parte do espaço em torno de Júpiter, essa perturbação deixa as órbitas instáveis, e os asteróides nessa região são gradualmente empurrados para outras órbitas. Mas em torno destes dois pontos Lagrangeanos, as órbitas são estáveis. Isso significa que os asteróides ali presentes provavelmente estão lá desde a época da formação do Sistema Solar. Por isso, pode-se dizer que estes asteróides são como “fósseis”, preservando informações de 4.5 bilhões de anos atrás, quando os planetas se formaram.
A missão Lucy vai fazer neste grande tour dos troianos as primeiras observações detalhadas de uma variedade de asteróides de tipos, tamanhos e situações diferentes, como pode ser visto na lista acima. O primeiro alvo, o Donaldjohanson, não é um troiano: é um asteróide do cinturão principal, que por acaso estava no caminho da missão. Então, vai ser observado, não só como um bônus, mas também para testar os instrumentos e, principalmente, testar o planejamento das observações a serem feitas dos alvos principais. Esse planejamento é bastante crítico, porque em missões de flyby, como essa, há apenas algumas horas de observação dos alvos, quando a sonda está passando por perto. Não há tempo para fazer o downlink, analisar as primeiras observações, decidir fazer mudanças, preparar novos comandos e enviá-los à espaçonave. Todas as observações têm que ser decididas previamente e a sonda executa todas elas de forma autônoma. Assim, é extremamente importante ter confiança no apontamento e na configuração programados para os instrumentos.
De onde vêm os nomes da missão e dos asteróides?
Por fazer a analogia com fósseis para esses asteróides, o nome da missão foi uma inspirado no fóssil hominídeo mais famoso de todos, a Lucy, um Australopithecus afarensis, de 3.2 milhões de anos de idade. E, por causa disso, o primeiro alvo da missão, o asteróide 52246, que não tinha nome até então, foi nomeado Donaldjohanson, em homenagem a um dos descobridores da Lucy. O nome do fóssil, por sua vez, vem da música dos Beatles, Lucy in the Sky with Diamonds, que tocava com freqüência no acampamento no dia da sua descoberta.
Já os outros alvos da missão, todos asteróides troianos, têm esses nomes por seguir um tema muito específico: Todos os troianos recebem nomes que vêm da mitologia Grega, ligados à guerra de Troia. Mais especificamente, os do ponto L4 recebem nomes de gregos, e os do L5, nomes de troianos. O número que aparece à frente de cada nome de asteróide é seu número de catálogo oficial, que simplesmente indica a ordem de sua descoberta. A grande maioria dos asteróides no Sistema Solar têm somente número, pois há asteróides demais para dar nome a todos.
Quem construiu e vai operar a missão?
A Lucy foi uma das duas propostas selecionadas em 2017 pela NASA, como a 13ª missão do programa Discovery (a outra escolhida, a 14ª, foi a Psyche). A nave em si foi feita pela empresa Lockheed Martin, com 1.5 t no lançamento, alimentada por 2 painéis solares de 6 m cada, para poder operar tão longe do Sol, e carrega um motor LEROS 1c Apogee, movido a hidrazina e óxidos de nitrogênio (MON), feito pela empresa britânica Nammo Space. A missão é baseada no Southwest Research Institue (SwRI, em Boulder, Colorado), operada pelo Goddard Space Flight Center da NASA (GSFC, em Greenbelt, Maryland). Seus instrumentos foram feitos no Goddard, no Applied Physics Laboratory (APL) da Johns Hopkins University (Laurel, Maryland) e na Arizona State University (em Phoenix, Arizona).
O lançador escolhido foi o Atlas V 401, da United Launch Alliance (ULA, uma associação entre as empresas Boeing e Lockheed Martin). Este é um dos foguetes mais bem estabelecidos hoje, com 88 lançamentos, todos bem sucedidos. Ele é um foguete de combustível líquio (RP-1/LOX), sem boosters nessa configuração, usando como segundo estágio o Centaur, movido a LH2/LOX (em breve teremos artigos sobre o Atlas V, que está sendo aposentado, e seu sucessor, o Vulcan). Além de muito confiável em geral, este será possivelmente ainda mais seguro, por ter sido preparado inicialmente para carregar a cápsula tripulada Starliner (com o atraso na Starliner, o foguete foi realocado para a Lucy).
Como será o lançamento:
Quais são os instrumentos científicos?
- L’Ralph – uma versão atualizada do instrumento Ralph da sonda New Horizons, usa o mesmo telescópio para alimentar um imageador multibanda de luz visível, o MVIC (Multispectral Visible Imaging Camera), operando no intervalo de comprimentos de onda de 400 a 850 nm, e um imageador hiperespectral de infravermelho próximo, o LEISA (Linear Etalon Imaging Spectral Array), que vai fazer espectros no infravermelho próximo, em um intervalo de comprimentos de onda 1 a 3.6 μm. Este é o principal meio para mapear a composição das superfícies dos asteróides, pela presença de bandas de absorção em seus espectros. Construído no Goddard Space Flight Center da NASA, em Maryland.
- L’LORRI – baseado no instrumento LORRI (Long Range Reconnaissance Imager) da New Horizons, construído pelo Applied Physics Laboratory da Johns Hopkins University, em Maryland. É uma câmera pancromática (sem filtros e de banda larga) operando em luz visível, com um telescópio de distância focal mais longa, para fornecer as imagens de mais alta resolução. Seu uso será mapear a morfologia das superfícies no maior nível de detalhes possível, além de observar os alvos a uma maior distância, para ajudar na navegação e procurar por mais satélites e anéis.
- L’TES – baseado no OTES (OSIRIS-REx Thermal Emission Spectrometer), construído pela Arizona State University, vai obter espectros de emissão no infravermelho, de 6 a 75 μm. Estes serão usados para determinar a composição e a estrutura dos asteróides (não só pela presença de bandas no espectro, mas também por como a temperatura varia entre dia e noite, o que revela a inércia térmica do material na superfície e logo abaixo dela).
- Radio science – não é exatamente um instrumento, mas o uso de medidas precisas do sinal de rádio da sonda para determinar a gravidade do asteróide (pelo efeito Doppler causado no sinal), e, se houver discos de poeira, medir a absorção do sinal ao os atravessar.
Saiba mais em
Site oficial: http://lucy.swri.edu/
Breve discussão da missão:
Uma apresentação mais detalhada: